9.6 - A Era Vargas (1930 - 1945)
A crise de 1929 atingiu todos aqueles países que mantinham relações comerciais com os Estados Unidos. Para o Brasil, a crise trouxe dificuldades para a elite cafeicultora e foi importante para a ruptura da chamada política do café com leite. As eleições realizadas em março de 1930 foram agitadas, marcadas por suspeitas e teve em sua sequência o início do chamado movimento de 1930 que colocou Getúlio Vargas no poder. Vargas governou o Brasil até 1945 e transformou-se em um dos principais personagens da história republicana brasileira. Os historiadores costumam dividir o longo período em que Vargas esteve no poder em três fases: governo provisório (1930 – 19434),governo constitucional (1934 – 1937), governo do estado novo ou ditatorial (1937 – 1945).
Getúlio Dornelles Vargas (1882 – 1954)
Nasceu em São Borja, no Rio Grande do Sul, em abril de 1882. De uma tradicional família ligada ao campo e grande proprietária de terra na fronteira com a Argentina, Getúlio manteve-se sempre ligado à principal atividade econômica dos pampas, a pecuária. Matriculou-se, em 1904, na Faculdade de Direito de Porto Alegre, onde se formou em 1907. Casou-se, em São Borja em março de 1911, com Darcy Sarmanho, de quinze anos de idade, com quem teve cinco filhos. Quanto a religião, Getúlio se declarava agnóstico. Iniciou sua carreira política em 1909 ao eleger-se deputado estadual pelo Partido Republicano Riograndense. Foi reeleito para esse cargo por quatro vezes.
Em 1923 foi eleito deputado federal e tornou-se líder da bancada dos gaúchos na Câmara dos Deputados, no Rio de Janeiro. Em 1927 ocupou o cargo de Ministro da Fazenda do governo de Washington Luís. Em janeiro de 1928 assumiu o cargo de Presidente do Rio Grande do Sul, encerrando o período de trinta anos do governo de Borges de Medeiros. Durante este mandato iniciou um forte movimento de oposição ao governo federal, exigindo o fim da corrupção eleitoral, a adoção do voto secreto e do voto feminino. Mesmo assim, manteve bom relacionamento com o presidente Washington Luís, obtendo verbas federais para o Rio Grande do Sul. Em 1930 chegou a presidência e governou o país por quinze anos. Morreu em 1954, após cometer suicídio.
Os efeitos da crise de 1929 no Brasil e as eleições de 1930
A crise do capitalismo que teve seu auge em 1929 foi sentida em grandes proporções no Brasil, especialmente pelos grandes cafeicultores. Nos Estados Unidos a quebra da bolsa de Nova York provocou a falência de fábricas e bancos e o desemprego atingiu boa parcela da população. Nessa época os E.U.A eram os maiores consumidores do café brasileiro e com o cenário econômico desfavorável naturalmente diminuíram suas compras. Com o produto sobrando, entre 1929 e 1930 o preço do café caiu mais de 50%. Apesar do governo ainda adotar a política de valorizar a produção cafeeira muitos cafeicultores foram à falência e perderam também seus poderes políticos. É nesse cenário de dificuldades que se realizaram as eleições presidenciais em março de 1930, a última da República Velha.
O presidente do Brasil em 1930 era Washington Luís, representante da oligarquia de São Paulo. Conforme a lógica do acordo entre paulistas e mineiros que revezavam o poder político naquele período, seria a vez de um representante de Minas Gerais assumir o posto de presidente da república. Porém, os políticos do Partido Republicano Paulista indicaram o paulista Júlio Prestes para concorrer ao cargo provocando assim a ruptura da parceria com Minas Gerais que lançou, por sua vez, a candidatura de Antônio Carlos Ribeiro de Andrade. Com o rompimento entre o PRP e o PRM os demais políticos que até então não tinham espaço aproveitaram-se da situação.
Foi nesse momento que se organizou aAliança Liberal, uma união política entre Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraíba e que lançou uma chapa para concorrer nas eleições de 1930. A Aliança Liberal indicou o gaúchoGetúlio Vargas para presidente e o paraibanoJoão Pessoa, para vice. Entre outras coisas o programa de reformas sugeridas pela aliança previa: voto secreto e permitido inclusive para as mulheres, incentivos a produção industrial e a criação de leis trabalhistas. Vargas e João Pessoa receberam apoio de setores do exército (especialmente dos tenentes), das classes médias urbanas e dos grandes proprietários insatisfeitos com o sucessivo revezamento político entre paulistas e mineiros.
As críticas contra o governo de Washington Luís cresciam em todo o país e os prejuízos de muitos cafeicultores e os altos índices de desemprego tornavam a candidatura da Aliança Liberal ainda mais popular. Apesar disso, as eleições que ocorreram no dia 1º de março de 1930 e deram a vitória a Júlio Prestes, que recebeu cerca de 1 milhão de votos contra 700 mil de Vargas. (Devido às regras eleitorais, somente 5% da população pôde votar). A derrotada Aliança Liberal imediatamente se demonstrou descontente e se negou a aceitar o resultado da eleição alegando que a vitória de Júlio Prestes havia sido fraudada. [1]
Aproveitando-se do crescente descontentamento de grupos sociais emergentes como militares, que criticavam o sistema eleitoral, defendiam o voto secreto e reformas sociais e econômicas, e mais classes médias e operariado que não tinham seus interesses atendidos pelo governo, lideranças da Aliança Liberal passaram a conspirar contra governo na tentativa de impedir a posse de Júlio Prestes que ocorreria no início de 1931. O clima tenso e a insatisfação da maioria da população contra o governo era favorável para a o ocorrência de um movimento de que tomasse o poder pelo uso da força. Muitos passaram a falar em revolução. O próprio governador de Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro, teria dito: “façamos a revolução antes que o povo a faça.” A situação agravou-se quando no dia 26 de julho de 1930 João Pessoa foi assassinado. Embora o crime tivesse sido motivado por questões pessoais e rivalidade políticas na Paraíba, foi muito bem explorado por militantes da Aliança Liberal e rapidamente se associou ao governo de Washington Luís. A partir desse momento passaram a ocorrer várias manifestações de repúdio ao governo e favoráveis a Aliança Liberal.
No dia 03 de outubro teve início no Rio Grande do Sul um movimento com o objetivo derrubar o governo e impedir a posse de Júlio Prestes. Ao mesmo tempo ocorriam movimentos no Paraná, em Minas Gerais e na Paraíba. Rapidamente a rebelião se espalhou pelo país. No dia 10, Getúlio Vargas lançou o manifesto O Rio Grande de pé pelo Brasil e partiu em comitiva para a capital da República. Forças contrarrevolucionárias pouco puderam fazer para deter o movimento que ganhava cada vez mais popularidade. No dia 24 de outubro os militares depuseram o presidente Washington Luís e impediram a posse de Júlio Prestes, que ocorreria no dia 15 de novembro. Uma junta militar transferiu o poder para Getúlio Vargas, principal nome do movimento, que assumiu o governo de modo provisório. Embora existam discussões em torno do caráter do movimento (golpe ou revolução) é de entendimento de todos que o episódio teve uma grande importância histórica. O golpe ou revolução de 1930 marcou o final da República Oligárquica ou “república do café-com-leite”.
GOVERNO PROVISÓRIO (1930 – 1934)
Assim que assumiu como presidente, Vargas tratou de controlar politicamente o país. Vargas pretendia desmontar a estrutura de poder dos fazendeiros-coronéis que caracterizou a República-Velha e acabar com os privilégios que principalmente a oligarquia de São Paulo tinha no sistema político antigo. Embora tivesse caráter provisório e o objetivo de reorganizar a vida política do país, o governo tornou-se centralizador e pouco democrático. Para garantir o controle político do país Vargas tomou as seguintes medidas:
- Fechou todos os órgãos do poder Legislativo.
(Congresso, Assembleias Estaduais e Câmaras Municipais).
- Destituiu os presidentes de estados e nomeou pessoas de sua confiança para governa-los, chamados interventores. Como tiveram grande importância no movimento de 1930, boa parte desses interventores nomeados por Vargas eram militares. Com esses interventores o presidente pretendia ampliar a sua base de apoio político e enfraquecer as alianças feitas pelos coronéis-fazendeiros que apoiaram os presidentes na Primeira República.
AS MUDANÇAS NA POLÍTICA, NA ECONOMIA E NA SOCIEDADE
A partir da década de 1930 várias mudanças políticas, sócias e econômicas passaram a ocorrer pelo Brasil. Aos poucos o café deixou de ser a única riqueza do país e as cidades ganharam importância em relação ao campo. Na medida em que a indústria se desenvolvia a classe operária foi se organizando e ganhando consciência de seus direitos.
Na política, ainda durante o período do governo provisório, criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, para satisfazer a elite industrial que crescia, e o Ministério da Educação e Saúde. Na economia era um defensor das riquezas nacionais sendo favorável a diversificação da produção e da industrialização. Os adversários políticos, concentrados principalmente em São Paulo, logo se assustaram com as posições de Vargas.
Getúlio Vargas deu início à modernização do país fazendo investimentos no ensino superior, criando os departamentos de Correios e Telégrafos e de Aviação Civil, o Instituto Nacional de Estatística, atual IBGE, o Instituto do Açúcar e do Álcool, o Código de Minas, o Código Florestal, Código Brasileiro de Telecomunicações e a Ordem dos Advogados do Brasil, OAB. Além disso, demonstrou preocupação com duas importantes questões nesse período: o avanço do comunismo e o desemprego. A partir de 1917 os ideais do comunismo passaram a se disseminar pelo mundo e chegaram com força ao Brasil. Nessa época o Partido Comunista Brasileiro (PCB) foi posto na ilegalidade e temendo a continuidade de greves e de revoltas trabalhistas o governo passou a dar grande atenção aos trabalhadores.
Uma das principais marcas do governo provisório de Vargas foi a criação da Lei da Sindicalização que permitiu um avanço nas leis trabalhistas. Aos poucos foram sendo estabelecidos os primeiros direitos aos trabalhadores, como jornada de 8 horas de trabalho e férias, por exemplo. Para tentar evitar o aumento do número de desempregados, Getúlio restringiu até 1933 a entrada de imigrantes no Brasil.
Política de valorização do café e
diversificação da produção agrícola
Para resolver o problema da superprodução de café e os efeitos da crise de 1929, o governo brasileiro procurou manter os preços estáveis e diminuir a oferta do produto no mercado. Foi criado o Departamento Nacional do Café e entre 1931 e 1943 cerca de 80 milhões de sacas de café foram adquiridas pelo governo e queimadas ou jogadas ao mar. O governo regulou a produção proibindo novas plantações durante três anos. Além disso, foram feitos investimentos na diversificação da agricultura e dado incentivo a produção de algodão, cana-de-açúcar, borracha, cacau entre outros.
Revolução Constitucionalista de 1932
O governo de Vargas tornou-se centralizador e pouco democrático e em São Paulo concentrava-se a maior força de oposição a ele. Especialmente os fazendeiros do café, acostumados em controlar o poder político, não aceitavam o interventor nomeado para São Paulo, o tenente pernambucano João Alberto, e exigiam um interventor civil e paulista. Com grande participação do Partido Republicano Paulista, tornaram-se intensas no estado as manifestações populares contra o governo provisório sendo que os manifestantes eram em sua maioria estudantes universitários, comerciantes, industriais e profissionais liberais.
Os paulistas também estavam descontentes com o fato de Vargas ainda não ter convocado eleições constituintes para que fosse elaborada uma nova constituição para o país e que assim pudessem ser realizadas eleições presidenciais. Afinal de contas, o governo era provisório e estava se estendo por muito tempo. O movimento cresceu e ganhou caráter revolucionário. Pressionado, em fevereiro de 1932 Vargas nomeou Pedro de Toledo, paulista e civil para ser interventor de São Paulo e marcou eleições para a Assembleia Constituinte. Apesar disso, as manifestações cresceram e os conflitos nas ruas tornaram-se mais violentos. Manifestantes invadiram a casa de armas e as sedes dos jornais que apoiavam o governo.
O governo reagiu e quatro estudantes acabaram mortos: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo. As iniciais dos nomes de cada um deles tornaram-se um dos símbolos da revolução constitucionalista –MMDC. Os revolucionários acreditavam que receberiam apoio dos estados de Minas Gerais, Mato Grosso e do Rio Grande do Sul, o que não se confirmou. Isolados e sem condições de enfrentar a superioridade militar das tropas federais, os paulistas renderam-se no dia 28 de setembro de 1932. Mesmo derrotados os paulistas puderam celebrar a convocação da Assembleia Nacional Constituinte.
Eleições para Assembleia Constituinte
Em maio de 1933 foram realizadas as primeiras eleições após a Revolução de 1930. Essa eleição apresentou diferenças fundamentais em relação as eleições realizadas durante a República Velha por ter sio organizada pelo Tribunal de Justiça Eleitoral, criado justamente para fiscalizar e combater as fraudes eleitorais tão comuns no período. O voto foi secreto, direto, obrigatório e puderam votar todos os brasileiros alfabetizados com mais de dezoito anos. Uma importante marca dessa eleição foi o direito que as mulheres tiveram de votar pela primeira vez no Brasil. Foram eleitos 250 deputados que teriam o compromisso de elaborar uma nova constituição para o país.
A Constituição de 1934
Entre os deputados eleitos para elaborar a nova constituição do Brasil haviam muitos representantes da classe média e dos trabalhadores. Sendo assim, muitos dos artigos da constituição atendiam aos interesses desses grupos sociais. A constituição foi considerada progressista para a época propondo grandes mudanças nas regras eleitorais e na política trabalhista.
REGRAS ELEITORAIS E DIREITOS DEMOCRÁTICOS: A constituição definiu voto secreto e eleições diretas para os poderes executivo e legislativo e as mulheres ganharam o direito de votar. O mandato seria de quatro anos e sem possibilidade de reeleição imediata. O cargo de vice-presidente foi extinto. Para evitar as fraudes que caracterizavam as eleições, foi criado o Tribunal Eleitoral e a Justiça Eleitoral. As primeiras eleições presidenciais seriam indiretas. Ou seja, o presidente seria eleito entre os membros da assembleia que seria transformada em Congresso Nacional.
EDUCAÇÃO: Ficou estabelecido o ensino primário e gratuito. Ainda foi determinado prazo para o ensino superior também se tornar gratuito.
NACIONALISMO ECONÔMICO: proteção das riquezas naturais do país, como jazidas minerais; consideradas essenciais para o desenvolvimento do país. As empresas estrangeiras foram obrigadas a ter pelo menos 2/3 de empregados brasileiros.
LEIS TRABALHISTAS: Os direitos dados aos trabalhadores foram a grande marca da constituição de 1934. Foi instituída a Carteira de Profissional de Trabalho, foi garantida ajornada de trabalho de 8 horas diárias, estabelecido salário mínimo, direito a férias, regulamentado o trabalho para menores de idade e para as mulheres, ordenando que se pagasse a elas salários iguais aos dos homens. Além disso, foi proibido o trabalho a gestantes, um mês antes e um mês após o parto e a nova constituição garantiuindenização para trabalhadores demitidos sem justa causa, assistência médica e dentária.
GOVERNO CONSTITUCIONAL
(1934 - 1937)
No dia 16 de julho de 1934 a Assembleia divulgou a nova Constituição do Brasil. Após terminar a tarefa de elaborar a Constituição, a Assembleia Constituinte foi transformada em Congresso Nacional, que teria, como primeiro compromisso, eleger o presidente da república. Getúlio Vargasrecebeu 175 votos contra 59 votos de seu tradicional rival político no Rio Grande do Sul, Borges de Medeiros. Vargas assumiu o cargo de presidente para um mandato de quatro anos tendo dessa vez uma constituição em vigor e que deveria ser respeitada.
O governo constitucional de Vargas teve início em um momento em que o país ainda sentia muito os efeitos da crise do capitalismo. Vargas assumiu seu mandato presidencial em um momento econômico muito complicado marcado pela falência de muitos cafeicultores e de grandes comerciantes e industriais. Havia grande expectativa em relação às medidas que seriam tomadas para combater o desemprego e a inflação. O movimento de 1930 trouxe grandes mudanças na vida de boa parte da população brasileira. Porém, as mudanças prometidas pelo governo eram contrárias aos interesses dos grandes latifundiários e industriais e nesse contexto surgem na vida pública e política do país dois importantes grupos: integralistas e os aliancistas.
Na prática, os dois grupos faziam oposição ao governo, porém, foi o rápido crescimento da Aliança Nacional Libertadora por todo o país, a proximidade ideológica que os aliancistas tinham com o comunismo e as fortes críticas feitas contra o governo que mais assustaram Vargas. Apoiado por setores mais conservadores, Getúlio considerou a ANL ilegal, proibiu as atividades da Aliança, ordenou o fechamento da sede e a prisão de suas principais lideranças.[2] Na visão do governo e da elite conservadora, o comunismo era o perigo a ser combatido. Mesmo proibidos de atuar, os aliancistas continuaram com suas atividades e organizaram uma revolta em novembro de 1935 que ficou conhecida como a Intentona Comunista ou Revolta Vermelha. Essa revolta contaria com o apoio dos principais quartéis do país mas por fim somente um em Natal, um em Pernambuco, um no Rio Grande do Norte e um no Rio de Janeiro aderiram o movimento. Todas as rebeliões foram rapidamente dominadas pelas forças governamentais.
Inspirados nas ideias fascistas de Benito Mussolini e nas ideias nazistas de Adolf Hitler, em 1932, por iniciativa dePlínio Salgado e de outros políticos, foi lançado o Manifesto a Nação. Os integralistas criaram a Ação Integralista Brasileira, uma organização política que contava com o apoio de grandes proprietários de terra, de empresários e de parte das forças armadas. Os integralistas combatiam o comunismo e a existência de um Estado Poderoso em que um único chefe tivesse o poder. O lema dos integralistas era: Deus, Pátria e Família. Eram organizados sob rígidas ordens militares, vestiam-se com camisas verdes e tinham até mesmo um grito de saudação: Anauê. Ao todo, existiram mais de mil núcleos integralistas pelo país.
OS ALIANCISTAS
A Aliança Nacional Libertadora era uma organização política composta por setores de diversas correntes ideológicas (reunindo democratas, tenentes, operários e intelectuais) e que era contrária a Ação Integralista Brasileira. Uma das principais correntes políticas dentro da Aliança, que era liderada por Luís Carlos Prestes, era o Partido Comunista, fundado no Brasil em 1922 e que atuava na ilegalidade, já que havia sido proibido de funcionar. Os aliancistas, como eram chamados os membros da ANL, pretendiam derrubar o governo e promover uma transformação profunda e rápida no país. O programa de metas da ANL previa a nacionalização de empresas estrangeiras instaladas no país, o não pagamento da dívida externa e uma reforma agrária, isto é, a desapropriação de grandes latifúndios e a distribuição de terra entre os trabalhadores do campo.
O plano Cohen e o golpe do Estado Novo
As eleições para a sucessão presidencial estavam marcadas para janeiro de 1938 e, pela constituição, Vargas não poderia se candidatar para uma reeleição. A campanha teve início em 1937 e apresentaram-se três candidatos: o ex-governador de São Paulo, Armando de Salles, o escritor paraibano José Américo de Almeida, e o líder integralista, Plínio Salgado. Getúlio Vargas aparentemente apoiava José Américo de Almeida, porém, na verdade, não estava disposto a deixar o cargo de presidente da república.
No dia 30 de setembro, o general Góis Monteiro, quando a campanha eleitoral estava em seu auge, divulgou pelo rádio em cadeia nacional a existência de um suposto plano arquitetado pelo Partido Comunista Brasileiro e por organizações internacionais. Pelo Plano Cohen, como ficou conhecido, os comunistas pretendiam tomar o poder, incendiar igrejas e prédios públicos, promover greves e assassinar as principais lideranças políticas do país. Desse modo, estava por ocorrer no país uma nova insurreição armada, semelhante à Intentona de 1935, que terminaria com o regime democrático e daria início a uma revolução comunista.[3] A notícia se espalhou rapidamente e provocou grande apreensão especialmente nos setores elitistas e conservadores.
Na verdade o plano foi uma farsa arquitetada pelo próprio governo para justificar o golpe que instalou um regime ditatorial no país. Vargas recebeu apoio dos generais Eurico Gaspar Dutra, Góis Monteiro e de importantes lideranças integralistas. Alegando estar combatendo o perigo comunista Getúlio solicitou ao Congresso Nacional que fosse decretado Estado de Guerra. Após ter seu pedido atendido no dia 1º de outubro o presidente passou a fazer uso de seus poderes ordenando uma intensa perseguição aos comunistas e a opositores políticos. Ao mesmo tempo a imprensa passou a sofrer forte censura.
No dia 10 novembro de 1937 Getúlio ordenou o fechamento do Congresso Nacional e dos poderes legislativos em todo o Brasil, suspendeu as eleições presidenciais, extinguiu os partidos políticos e anulou a constituição de 1934 inaugurando desse modo o período ditatorial de seu governo, chamado de Estado Novo.
GOVERNO DO ESTADO NOVO
(1937 - 1945)
Alegando estar combatendo o “perigo comunista” Vargas deu início ao governo do Estado Novo com o golpe de 10 de novembro de 1937. A constituição de 1934 foi abolida e uma nova, que lhe dava plenos poderes, entrou em vigor. A constituição de 1937 determinava que o poder político estava todo concentrado nas mãos do presidente, porém nunca chegou a entrar plenamente em vigor precisar ser aprovada em um plebiscito que nunca chegou a ocorrer.[4] Vargas passou a governar através de decretos e a nomear, como havia feito durante o governo provisório, interventores para cada um dos Estados. O governo estava autorizado a invadir casas, prender pessoas, julgá-las e condená-las. O autoritarismo foi uma das principais marcas do governo nessa fase.
q O Congresso Nacional e os legislativos estaduais e municipais foram fechados. Assim como durante o governo provisório, foram nomeados interventores para cada um dos Estados, que perderam sua autonomia.
q Os partidos políticos foram extintos e as eleições foram suspensas em todo o país.
q Greves e manifestações contrárias ao governo foram proibidas e eram duramente reprimidas pela polícia. A repressão aumentou com o início da Segunda Guerra Mundial em 1939.
A polícia política do governo de Vargas durante o Estado Novo foi comandada por Filinto Müller,político e militar simpatizante do nazifascismo. Durante período ditatorial, Filinto Müller comandou órgãos responsáveis pela perseguição, prisão, tortura e morte de milhares de pessoas.
q A censura a imprensa foi uma das marcas da ditadura de Vargas.
q Esse período foi marcado pelos grandes investimentos feitos em propaganda. Para conquistar a simpatia popular, foram feitos grandes investimentos em propaganda.
O Brasil na Segunda Guerra Mundial
A Segunda Guerra Mundial iniciada em 1939 colocou as potências do eixo (Alemanha, Itália e Japão) contra as potências aliadas (lideradas por Inglaterra, E.U.A e União Soviética). Nesse cenário, apesar das semelhanças com os governos totalitários de Hitler e Mussolini, o governo brasileiro optou por manter-se neutro na guerra. Enquanto ganhava tempo, Vargas procurava obter vantagens econômicas e políticas. A partir de 1941 o governo passou a negociar com os aliados. Através de acordos internacionais ganhou apoio financeiro dos EUA para a construção da Usina Siderúrgica de Volta Redonda, fundamental no processo de industrialização do país. Em troca do financiamento, o governo comprometeu-se a fornecer borracha e minério de ferro para as potências aliadas e permitiu que os norte-americanos construíssem bases militares no Nordeste brasileiro. Os alemães não aceitaram a cooperação entre Brasil e Estados Unidos e, entre fevereiro e agosto de 1942, bombardearam e afundaram navios brasileiros. Em agosto de 1942 o Brasil declarou guerra contra as potências do eixo. Somente em julho de 1944, quase dois anos após a declaração de guerra, a FEB (Força Expedicionária Brasileira) foi enviada para a Europa. Foram enviados para a guerra cerca de 25.000 homens e, mesmo com problemas na preparação e no envio, a Força Expedicionária Brasileira cumpriu as principais missões que lhe foram atribuídas pelo comando aliado. A atuação da FEB se deu basicamente na Itália.
Propaganda, crescimento industrial e trabalhismo
A forte propaganda, o incentivo ao crescimento industrial e a proteção ao trabalhador foram características importantes da Era Vargas e se acentuaram ainda mais durante o Estado Novo. Desde 1931 Getúlio Vargas já tinha a preocupação em criar e promover a imagem positiva de seu governo através de um órgão responsável pela propaganda oficial. Conforme a oposição aumentava o órgão crescia em importância assumindo novas funções. Em 1939 foi criado o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) que, além de ter o compromisso de divulgar a imagem positiva do Estado Novo e assim garantir sua popularidade, deveria censurar os meios de comunicação (rádio, jornais, livros, cinema) que fossem contrários ao governo. O DIP distribuía cartazes que apresentavam Vargas como “Salvador da Pátria” e pelo rádio, através da criação do programa a Hora do Brasil, eram divulgadas as realizações do governo. Ao mesmo tempo o Ministério da Educação ajudou a promover a imagem positiva de Vargas e nas escolas eram difundidos os ideais nacionalistas. É nesse momento de seu governo que fica mais evidente a característica populista[5] de Vargas.
No setor trabalhista, durante o Estado Novo foram consolidadas as leis do trabalho (CLT). Ficaram estabelecidos direitos como descanso semanal remunerado, férias, décimo terceiro salário, carteira de trabalho, licença a maternidade, aposentadoria entre outros. Embora tenham sido alcançados com muita luta, Vargas, através de forte propaganda, tratou o conjunto de direitos trabalhistas como sendo um presente seu ao trabalhador. Curiosamente, ao mesmo tempo em que garantia os direitos aos trabalhadores o governo passou a controlar a ação dos sindicatos através da supervisão do Ministério do Trabalho.
Apesar das dificuldades provocadas pela crise de 1929 e pelo início da Segunda Guerra Mundial, Vargas soube tirar proveito da situação e promover a industrialização do país. Com seus principais parceiros comerciais passando por dificuldades econômicas ou em guerra, o Brasil se viu forçado a fabricar o que antes importava. Desde que assumiu a presidência em 1930 Vargas adotou a política intervencionista no campo econômico, criando órgãos estatais para planejar as atividades econômicas. Setores de infraestrutura, como o extrativismo mineral, os transportes e a produção de energia elétrica ganharam maior atenção. Pretendo diminuir a importação de produtos industrializados o governo passou a estimular o desenvolvimento industrial do país. Entre as décadas de 1930 e 1940 o número de indústrias instaladas no Brasil dobrou, sendo que o crescimento foi maior nos setores de alimentos, tecidos, calçados e móveis. Na mesma época várias empresas estrangeiras se instalaram no país fabricando especialmente produtos químicos, farmacêuticos, eletrônicos e motores.
O governo tinha dificuldades para promover a indústria de base, isto é, produção de bens como máquinas e equipamentos pesados, produtos químicos básicos e minérios. Sendo assim, além de conceder empréstimos a indústria, o governo fundou empresas estatais para atuar na siderurgia e na mineração. Dois exemplos são aCompanhia Siderúrgica Nacional (CSN), instalada no ano de 1941 em Volta Redonda, no Rio de Janeiro, e aCompanhia do Vale do Rio Doce, com o objetivo de explorar minério de ferro, instalada em Minas Gerais no ano de 1942. O aço e o minério de ferro fornecidos por essas empresas foram fundamentais para a continuidade do desenvolvimento industrial. Antes disso, em 1938, preocupado com as fontes de energia para movimentar o parque industrial, o governo criou o Conselho Nacional do Petróleo que teria a função de explorar e fornecer o produto e seus derivados. Em 1939, na Bahia, foi perfurado o primeiro poço petrolífero. Apesar de o governo ter incentivado a diversificação da produção agrícola, durante a Era Vargas a indústria assumiu a liderança que durante toda a República Velha foi ocupada pela agricultura.
O fim do Estado Novo
Apesar da grande popularidade e do crescimento econômico e industrial, a partir do ano de ano de 1940 o governo entrou em um processo de desgaste. A guerra contra o nazifascismo acabou servindo, curiosamente, para fortalecer os grupos que faziam oposição a Getúlio Vargas. Afinal de contas, o Brasil em guerra lutava para derrubar regimes autoritários na Europa, mas no país as liberdades individuais e democráticas não eram respeitadas. Era uma visível contradição. As contestações ao Estado Novo passaram a ocorrer em 1943, quando um grupo de advogados mineiros publica o chamado Manifesto dos Mineiros defendendo a redemocratização do país.
Percebendo a maior organização da oposição e o avanço, das ideias liberais, Vargas decidiu promover a abertura democrática. Foi fixado um prazo para ocorrer eleições presidenciais, libertados presos políticos, permitido o retorno ao país dos exilados pela ditadura do Estado Novo e autorizada a organização partidária. Getúlio pretendia dessa maneira apagar sua imagem de autoritário.
Partidos como a UDN (União Democrática Nacional); PSD (Partido Social Democrático); PTB (Partido Trabalhista Brasileiro); PSP (Partido Social Progressista) ganharam maior destaque e, além disso, foi permitida a legalização do PCB (Partido Comunista do Brasil), que vivia na clandestinidade. Nas eleições presidenciais, marcadas para 2 de dezembro de 1945, concorreriam três candidatos: o general Eurico Eduardo Dutra (pelo PSD e PTB), o brigadeiro Eduardo Gomes (pela UDN); o engenheiro Yedo Fiúza (pelo PCB). Nas eleições, marcadas para dezembro de 1945, Vargas aparentemente apoiava Gaspar Dutra, mas, ao mesmo tempo estimulava o movimento popular que lhe apoiava e exigia sua permanência no poder. Esse movimento ficou conhecido como queremismo, devido as palavras de ordem: “Queremos Getúlio!” Temendo o grande prestígio que Getúlio tinha junto ao povo e que o mesmo pudesse impedir as eleições ou estivesse tramando sua permanência no poder, setores da oposição, liderados especialmente pela União Democrática Nacional, uniram-se para derrubar Vargas da presidência. No dia 29 de outubro de 1945, antes das eleições, tropas do exército cercaram o Palácio do Catete e obrigaram Vargas a renunciar. Terminou assim a Era Vargas.
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